quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Feliz 2009

A todos os que acompanharam ou acompanham este blog, um 2009 cheio de felicidade, alegria e realização.
A nós, professores, que o ano novo traga mais novidades positivas para nossa carreira.
Um grande abraço!

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Espaço para todos

Quando eu era um estudante de 2º grau, havia um professor de português que também era poeta. Seu nome era Raul Püschel. Era um grande cara, com um grande coração. Fez as primeiras críticas técnicas do que eu escrevia. Uma figura que marcou profundamente minha decisão tardia de fazer graduação em Letras.
Todas as pessoas que conheço têm sempre um nome de professor guardado com carinho dentro do coração. E, para cada pessoa, o professor marcante é de um determinado jeito.
O professor Raul era um cara elegante, inteligente, muito versado em literatura, do tipo paizão (lembro que deu três ou quatro pontos para um colega meu no fim do ano, para que ele não reprovasse), sempre disponível, acessível e aberto ao que trazíamos. O tipo de professor que eu considero importante para mim.
Outras pessoas lembram de outros perfis de professor. Um ex-aluno nosso da Prefeitura vivia repetindo que tinha respeito e admiração por um colega linha dura, que gritava com os alunos e era extremamente exigente. Uma moça da minha família admirava um professor que sabia muito da matéria que lecionava, determinava leituras em línguas estrangeiras e mandava os alunos se virarem. Colegas meus lembravam, quase sempre, de professores que, em diferentes situações, davam respostas curtas e definitivas para insolências em sala.
Onde quero chegar com isso?
No seguinte: acho que cada escola, cada instituição de ensino, precisa se policiar em relação à capacidade de manter grupos em que as pessoas são díspares, têm comportamentos diferentes e atuam de maneira distinta em sala de aula.
Nós, da Prefeitura, escolhemos as escolas e as classes em que vamos trabalhar. E o grupo de trabalho se forma a partir dessas escolhas. Portanto, temos colegas de toda a sorte, trabalhando com estilos que não necessariamente têm a ver um com o outro. Isso gera problemas? Depende. Se as coordenações compreendem sua função de agregadoras, podem conseguir extrair o melhor de cada professor dentro de seu estilo de trabalho. Há espaço para o professor linha-dura, para o professor bonachão, para o professor distante, para o professor afetuoso. É positivo para as crianças - faz parte do desenvolvimento da inteligência emocional - aprender a lidar com diferentes concepções de mundo e de aprendizagem. Se se mantém uma linha geral de trabalho e se alguns excessos são contidos, é plenamente possível conseguir grandes resultados, e não apesar das diferenças, mas justamente por causa delas.
Entretanto, se as coordenações, por ansiedade de resultados ou limitação de sensibilidade, prestigiam um estilo de trabalho em detrimento de outro, e estabelecem um padrão de comportamento único para os professores, teremos inevitavelmente o problema da inautenticidade: os professores se forçarão a agir de uma forma contrária ao que trazem de melhor dentro de si e os alunos perceberão. Além disso, muitos professores se sentirão insatisfeitos, por saberem que podem render melhor de outro modo.
Assim como eu guardo com carinho a lembrança das aulas do professor Raul, gostaria que meus alunos se lembrassem de mim pelo que tenho de melhor, e que pode fazer diferença. Não adianta, para mim, fazer cara feia e botar a classe em silêncio com ameaças. Eu não funciono assim. Os alunos que funcionam assim vão se decepcionar comigo. Dane-se. Não posso agradar a todos. Há professores que os agradarão, com certeza.
Sempre que encontro um aluno meu que me saúda com efusão, ele pergunta se eu ainda levo o violão às aulas, ou conto histórias. Esse é um indicativo de que esses recursos marcam emocionalmente. Creio que devo investir nisso. Acredito que as melhores coordenações e direções que tive foram as que me deram apoio e oportunidade de desenvolver esse tipo de trabalho. Não sei quanto os alunos aprendem ou desaprendem nas minhas aulas. Sei que, se se tornam mais humanos, e compreendem que o desenvolvimento intelectual depende da vontade de conhecer mais e crescer como indivíduo, estou satisfeito. Essa é minha seara, meu estilo, minha missão. A missão de outros é disciplinar; outros são melhores com conteúdos; outros conseguem liderar e criar trabalhos coletivos. Cada um tem seu talento. E, para o bem do aluno e da escola, é preciso que haja espaço para todos. Ou não educamos para a diversidade?

sábado, 20 de dezembro de 2008

Formulação de hipótese

O leitor deve se lembrar de um quadro do programa "A praça é nossa" em que um professor escrevia palavras estranhas na lousa para posteriormente lê-las de forma que a frase fizesse sentido. O bordão desse quadro era "as palavras se escrevem como se pronunciam".
Pois é. Era fim de ano, conselhos terminados, notas fechadas, conteúdo vencido, tudo feito com uma antecedência de quase um mês. Ainda assim, havia uma escancarada preocupação do administrativo e coordenadoras da escola em "segurar" o aluno, mantendo-o freqüente. O motivo era a amalucada decisão de se aplicar a prova São Paulo no dia 12 de dezembro, e o medo de ter de justificar uma ausência em massa a esse evento tão motivador (mais um caso de MISH).
O que fazer? A opção sugerida não me aprouve: fingir que as notas e faltas não estavam fechadas, e continuar lascando matéria, fazendo chamada e corrigindo exercícios até o fim do ano. O aluno não é bobo, muitos já não vinham, e eu estava a fim de experimentar algumas coisas diferentes. Optei por declarar que, sim, já estava tudo fechado, e que, nessas últimas aulas, eu faria recreação, jogos e brincadeiras.
Uma das brincadeiras era colocar na lousa uma charada para a classe descobrir. A brincadeira nada mais era que uma imitação do quadro no programa de TV acima citado. Um exemplo:

senão sá
bióquia com T
seu

Com um pouco de esforço e desfazendo-se das convenções de leitura habituais, o leitor poderá reconhecer nessa seqüência a sonoridade da expressão "'Cê não sabe o que aconteceu".
Ganhava quem descobrisse, pela sonoridade, a frase oculta.
Pois bem. Em todo jogo e brincadeira realizados em sala de aula há sempre uma turma mais participativa, que não raro é a dos alunos que têm melhor desempenho, e outra que fica mais alheia, porque não se sente em condições de disputar com os primeiros. Tanto na EJA (Educação para Jovens e Adultos, antigo supletivo) quanto no Fundamental II, ocorreu um fenômeno inesperado, pelo menos para mim. Os alunos com dificuldades de leitura apresentaram desempenho similar - até melhor, em alguns casos - ao dos alunos de leitura mais fluente. Fiquei pasmo ao ver a participação ativa e a capacidade de decifração de uma menina que não lê uma linha sequer durante as aulas, tamanha a sua dificuldade. Entre os adultos, aqueles com mais problemas de articulação das palavras foram os que mais conseguiram resultados positivos nesse jogo. Minha cara era muito engraçada: os olhos arregalados, um sorriso de fora a fora, e a pronúncia de um "muito bem!" que, em alguns casos, estava guardada desde o começo do ano.
Surpreendente.
Parei para refletir sobre esse resultado. Revendo o pouco que sei sobre letramento e alfabetização, entendi que, ao escrever as frases de uma forma que exigisse dos alunos a formulação de hipóteses para leitura, eu coloquei-os todos no mesmo patamar zero de decifração. Percebi que aqueles que têm maior domínio da leitura de textos na verdade adquiriram um maior repertório de percepções já automatizadas, e por isso batem os olhos nas palavras e já as assimilam. Os outros, que ainda não têm esse repertório, demoram na assimilação e, quando a realizam, já perderam os vínculos lógicos do texto. Ao escrever coisas como

Q. I. na
ceu piri
mero uó voa
h __________

na lousa, eu, sem querer, ofereci uma atividade em que esse repertório de percepções automatizadas não constitui vantagem, podendo até ser um fator de dificuldade, pois a decifração exige que o aluno dele se desfaça. Ganha, então, não quem já tem mais soluções de leitura na cabeça, mas aquele que está mais preparado para criar hipóteses sobre o que lê. E os alunos com dificuldades de leitura têm mais possibilidade disso, uma vez que o sistema de códigos da escrita ainda é, para eles, um mistério a decifrar.
Se eu não tivesse feito essa atividade, eu nunca teria sacado isso. Surpresas como essa é que fazem a gente gostar da profissão e entender que sempre é possível descobrir algo na nossa prática cotidiana. Ainda bem que eu resolvi brincar, e não encher a lousa de matéria.

P. S.: A segunda charadinha, para quem ainda não descobriu: "Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?".

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Memórias da recuperação de férias

Eu engatinhava no magistério então. Trabalhava como A.C.T. em escolas estaduais, o que significava ter aulas por contrato mas não ter vínculo com o Estado. Logo, quando o ano letivo acabou, eu não tinha trabalho, nem remuneração. Mas me avisaram de um trabalho que eu poderia fazer nas férias.
Havia um projeto para alunos que haviam perdido boa parte do ano letivo ou abandonado a escola. Eles eram comunicados via correio de que poderiam repor aulas e conteúdos em janeiro, e, assim, dar continuidade a seus estudos sem retornarem à mesma série. Escrito assim parece bonito e útil, mas era picaretagem da grossa. Era uma clara forçação de barra para diminuir índices de retenção. Era um tipo de aprovação promocional e semi-gratuita que nada acrescentaria aos alunos, mas contribuiria para números mais apresentáveis e passíveis de midiatização.
Mas eu precisava de grana, e fui. Dei aulas de Psicologia e Filosofia para uma única aluna, numa escola, e acho que três ou quatro, em outra. Creio que não dei mais de 5 ou 6 aulas. Passei um trabalhinho facílimo para avaliação, fechei as notas, entreguei, e pronto.
Pronto coisa nenhuma. Ainda tinha uma reunião com a supervisora do projeto na escola onde eu tinha mais alunos. Reunimo-nos numa salinha a chefe, eu, um professor de matemática, uma de português, e mais outra de disciplina que não me vem à mente.
A supervisora reexplicou o projeto, agradeceu nosso trabalho, e pediu as notas. O professor de matemática foi o primeiro a fornecê-las. Ele aprovara alguns alunos, mas reprovara quatro (não lembro se eram quatro mesmo, mas não importa), argumentando que não haviam nem comparecido à maioria das aulas, nem atingido a média necessária para aprovação.
A supervisora não gostou nem um pouco do que ouvira. Pediu as provas dos quatro alunos ao professor de matemática. E então tomou a atitude mais anti-ética que já presenciei em toda a minha carreira na educação.
Acredite se quiser, a supervisora simplesmente corrigiu de novo as provas do professor de matemática, rasurando as notas e substituindo-as por notas que aprovassem aqueles alunos. Isso na frente dele e de todos nós. E ainda falando, com agressividade e arrogância, que havia mais acertos que erros, e que, por isso, o professor não havia avaliado corretamente os alunos. O professor não reagiu; acho que não estava preparado para uma invasão tão ofensiva. Eu via aquilo e não queria ver. Onde estava errado, ela colocava meio-certo ou certo, depois somava os certos e meio-certos sem considerar o peso do exercício na nota final atribuído pelo professor, e escrevia uma nota acima de cinco, rabiscando a anteriormente colocada.
O silêncio na mesa era constrangedor. Mas estávamos desempregados, precisávamos receber aquela grama. Ela se virou para mim e perguntou sobre as notas.
- Todo mundo passou - respondi mais que imediatamente.
Todos os outros responderam assim também. Havíamos desistido. Não tivéramos coragem de interceder pelo professor de matemática, e não teríamos de fazê-lo por nós mesmos.
Aquela supervisora saiu da reunião satisfeita com as notas que os alunos obtiveram. Nós saímos conformados com o fato de que tínhamos feito o que se esperava de nós e receberíamos o combinado, afinal. Mas eu saí diminuído como ser humano.
E quando, hoje, vejo um colega ser tratado de uma maneira que lembre a humilhação impingida àquele professor de matemática, costumo intervir com mais veemência do que deveria. Provavelmente porque a indignação se misture à necessidade de compensar o silêncio vil daquele dia. Nessas horas, não ligo que me chamem pejorativamente de rebelde, como sempre fazem. Se não me entendem, pelo menos eu me entendo.

Tudo o que aqui contei realmente aconteceu, embora a distância no tempo faça alguns detalhes menos cristalinos. A essência da cena, entretanto, por quase inacreditável, é algo que não vai se apagar tão cedo das minhas recordações.

sábado, 22 de novembro de 2008

EX-4

Na quarta-feira que antecedeu o feriadão, veio uma banda de rock, denominada Ex-4, tocar para os alunos. Utilizaram o palco inadequado e estreito que temos no pátio para montar sua parafernália de amplificação. Os garotos se superaram e fizeram um belíssimo show, muito animado e muito bem recebido pela platéia.
Problemas, é claro, acontecem. No meio da imensa maioria que queria pular e cantar as músicas, alguns se preocupavam em empurrar os menores ou prensar os colegas mais próximos do palco. Mas é assim mesmo: para aprender a se portar em espetáculos, é preciso ter acesso a eles.
Adorei a iniciativa (creio que foi da diretora) de trazer a atração musical. Para a banda, é sempre bom. Além de formar público, eles conseguem divulgar seu material, que muitas vezes não tem tanto espaço nos meios de comunicação, e constroem uma relação de maior proximidade com futuros fãs. Para a escola, é pra lá de bom. Ela deixa de ser o espaço da bronca, da disciplina, da obrigação, para tornar-se o ambiente da alegria, da fruição, da festa. Não que se deva abandonar a ordem necessária ao desenvolvimento dos conteúdos; mas não se pode esquecer que a escola é, por princípio, espaço de socialização, que é também aprendizado.
Que venham mais bandas, de todos os estilos (rap, samba, rock, cult, o que for). Precisamos de gente que aceite correr os riscos de encarar essa meninada tão carente de tudo, inclusive de arte. Como seria bacana se as Viradas Culturais envolvessem escolas, ou se as escolas tivessem suas próprias viradas culturais de vez em quando, colocando a nosso favor toda a comunidade e valorizando o espaço da instituição como um espaço de arte, beleza, fruição, música, alegria, prazer. E aprendizagem, brotando de tudo isso.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Celular

Cena divertidíssima ontem em sala de aula. Eu coordenava a feitura de cartazes para a Mostra Cultural, em dezembro. A classe, com maior ou menor grau de interesse, produzia seus trabalhos, quando a inspetora entrou na sala perguntando por uma determinada aluna. Como é de praxe, os próprios alunos responderam antes de mim que essa aluna não estava. Passam-se alguns minutos e a outra inspetora bate na porta da sala, perguntando pela mesma aluna. Respondo que ela não estava presente, mas dessa vez me surpreendo quando vejo uma senhora que, da porta, faz uma varredura visual na classe com seu olhar caçador. É a mãe da garota. Diz a inspetora:
- A senhora está vendo? Ela realmente não está.
Ao que uma aluninha mais despachada acrescenta:
- Ela não está porque cabulou com beltrana e foi ao shopping.
Parêntese na historinha: é muito comum as crianças terem rasgos de sinceridade e colocarem os outros em enrascadas. Geralmente, isso é um misto de irreverência e inocência, muito mais a segunda que a primeira. Garanto que a menina não pensou no que estava dizendo; tanto que eu, naquele momento, não consegui disfarçar uma risada espontânea e paternal.
Continuando: a mãe foi embora, os alunos prosseguiram a produção, e só na hora do intervalo as inspetoras me elucidaram a questão.
A mãe telefonara para a escola perguntando se a filha estava presente. A escola lhe dera resposta negativa; desta forma, ligara para o celular da filha perguntando onde ela estava. Resposta: na escola, mamãe. Na sala de aula.
Ora, a mãe, de posse dessas informações tão dramaticamente inconciliáveis, resolveu ligar novamente para a escola, perguntando da filha. Depois de uma conversa um pouco tensa, veio à instituição para conferir com seus próprios olhos o que nossa funcionária lhe jurava de pé junto ser verdade: a filha havia cabulado. Daí a fala da inspetora acima transcrita.
Situação constrangedora, sem dúvida, mas que não deixa de ter seu lado cômico, especialmente para esse meu gênio espirituoso e festeiro.
Compreendo o que sentiu essa mãe, compreendo a esperteza da menina, compreendo a posição dos inspetores, e me delicio com a cara dos alunos e a facilidade com que acabam entregando seus colegas nesse tipo de situação. Para quem está de fora, observando, é um caso curioso e engraçado. Mas não deixo de registrar um ponto que me parece importante.
A escola, como a maior parte das instituições de ensino nos últimos tempos, recomenda explicitamente aos alunos não trazerem (e conseqüentemente não usarem) celulares. Normalmente, eles servem para ouvir músicas, jogar, e fazer e receber ligações em momentos inconvenientes. Muitos pais, entretanto, argumentam que preferem que suas crianças portem o aparelho, pois o celular lhes daria a segurança de poder localizá-las, funcionando como uma espécie de GPS das mesmas. O caso relatado mostra que o homem sempre é capaz de superar a máquina e driblar a tecnologia. Não importa quantas vezes o pai ligue para seu filho: este sempre terá a capacidade de inventar alguma lorota e enganá-lo. Se o fará ou não, isso não depende do aparelho; depende do arbítrio em formação, ainda experimentando e descobrindo truques, mentiras brancas e pequenas malandragens.
Essa breve cena anedótica que vivenciei serviu-me como reforço de uma cada vez mais universal percepção da inutilidade e perniciosidade dos celulares no ambiente escolar. Mas mesmo que não servisse para isso, foi um desses raros e bacanas momentos involuntários de descontração no meio do expediente.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

O caso de vandalismo no Amadeu Amaral

Menos de 24 horas depois de ter postado sobre a necessidade de compreender o desinteresse pelo magistério à luz das condições deploráveis encontradas para seu exercício, recebo uma bombástica notícia sobre um caso extremo de violência numa escola estadual em São Paulo. Creio ser própria do ser humano certa tendência a pensar "eu não disse?" quando algum de seus prognósticos é confirmado, ou quando alguma de suas análises ganha uma evidência comprobatória. Vou tentar deixar de lado a vontade de estar certo para analisar mais detidamente este episódio indigno.
O que aconteceu no Amadeu Amaral, do ponto de vista da intensidade e abrangência da ação violenta, ainda não é regra nas escolas públicas que conheço, graças a Deus. Mas as situações de descontrole e impossibilidade de contenção dos alunos são constantes, e isso é inegável. Vi episódios semelhantes; nenhum tão horroroso, mas muitos com dramaticidade similar, guardadas as proporções.
Na escola em que trabalho, o mais perto que chegamos disso foi a inundação de corredores pela abertura de hidrantes, duas vezes na mesma semana, e uma tentativa frustrada de bomba caseira, desbaratada pela ação policial. Eu estava no meio dessa cenas degradantes, tentando conter a sanha de uma horda alucinada e sedenta de reconhecimento pelas lideranças deliqüentes. Eu tive vontade de largar tudo. Graças a Deus não larguei. Entendi que muitas pessoas precisavam de minha pouca coragem restante naqueles momentos difíceis. Depois, fui deglutindo aos poucos essa experiência, e acabei me recuperando. Neste momento, portanto, minha maior preocupação é com a cabeça dos profissionais de educação e dos adolescentes que vivenciaram essas horas terríveis de barbárie, bem piores que as piores que já presenciei. Sei que não é fácil, sei que dá vontade de jogar tudo pra cima. Não sei se alguma dessas pessoas lerá este post, mas gostaria de dizer que entendo o sentimento que elas estão experenciando agora, e sou totalmente solidário às decisões que elas tomarem pensando em sua carreira ou sua integridade pessoal.
A notícia correu Brasil afora, via Jornal Nacional e Jornal da Globo. A repercussão foi tamanha que autoridades da secretaria da educação de São Paulo prometeram punição exemplar aos alunos que vandalizaram o colégio. William Bonner disse com todas as letras a palavra "expulsão", referindo-se a medidas cabíveis para punir os estudantes. E disse porque repetiu o que provavelmente aparecia em algum comunicado oficial. E eu fiquei chocado. Por dois motivos.
Primeiro, porque "expulsão" virou um termo tabu nas discussões sobre comportamento dos alunos. Há muitos anos ouço eufemismos para essa palavra, proferidos por professores, diretores e coordenadores. Visto que o aluno tem direito constitucional à escola, não se permitia dizer que ele seria expulso da mesma, mas sim transferido para outra unidade. Não se fala mais em expulsão há muitos anos no ambiente em que trabalho, pelo menos não oficialmente, e se nós ou os alunos utilizamos esse termo de forma descuidada, muitas vezes somos corrigidos pelos superiores hierárquicos. Sabemos que, na prática, a escola expulsa o aluno, mas ela nunca diz isso oficialmente, preferindo chamar a ação de transferência. Surpreendeu-me, assim, o uso tão desencabulado desse vocábulo pelos altos escalões da educação.
Segundo, porque, normalmente, a "expulsão" ou transferência de alunos das escolas é processo complicado, chato, delicado e determinado por grande número de variáveis. Quantas e quantas vezes, nesses dez anos de magistério, vi grupos de professores inconformados com a permanência de alunos na instituição em condições e situações absolutamente insustentáveis para a escola! Em post anterior, citei o caso de um aluno que deu um soco numa professora e NÃO FOI TRANSFERIDO. Repare o leitor: ele não quebrou uma carteira, ele agrediu um ser humano, e NÃO FOI TRANSFERIDO. E quando foi discutida sua situação no âmbito das questões internas da escola, em nenhum momento ninguém usou a palavra "expulsão". Há casos graves, alguns até criminais, que não resultam sequer em transferência. Quero crer que, no caso da escola depredada, há que se considerar o fator mídia: quando o acontecimento ganha os jornais e a TV, é preciso mostrar que providências serão tomadas. Mas fica uma impressão ruim: a de que agressões e ações violentas, se não ganham espaço na mídia, são minimizadas e relevadas, ficando restritas às soluções-padrão de "abafa geral" das coordenadorias, enquanto aquelas que viram notícia permitem a construção de um discurso que demonstre força e implacabilidade por parte do sistema.
Não defendo nem condeno as expulsões; essa é uma outra questão na qual nem pensei. Para mim a questão é saber se a preocupação é com a educação ou com a mídia. Porque parece-me que muitos julgam ser mais fácil lidar com a mídia que com a educação. Eu não gosto do "abafa geral", e julgo que a mídia pode jogar a nosso favor se focar o que realmente acontece nas salas de aula e nas escolas em que trabalhamos. O horroroso episódio de hoje me faz pensar que é possível recuperar uma parcela da indignação da sociedade em relação aos problemas enfrentados pelos professores. Só não acho que tenha de ser a esse preço, e por isso acredito que seja necessária uma atitude jornalística mais comprometida com a educação e suas mazelas, que não fique esperando outro espetáculo de bárbarie para tocar nas questões fulcrais que nos dizem respeito.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Causas e efeitos

Reportagem da Folha de São Paulo de ontem (Terça-feira, 11 de novembro, Caderno Cotidiano, C5) tem como título "Procura por carreira que forma professor cai até 58% na Fuvest". Li a matéria, mas ainda não cheguei a conclusões. A procura por Pedagogia e Licenciaturas na Fuvest caiu numa porcentagem bem maior que a da queda das inscrições. Isso provavelmente indica desinteresse pela carreira. Mas o texto termina com a indicação de que cursos semi-presenciais de Pedagogia tiveram um crescimento de 135%. Sem os dados sobre o crescimento dos semi-presenciais em geral não podemos saber se Pedagogia teve, proporcionalmente a outras carreiras, maior ou menor procura. De qualquer forma, parece-me que as pessoas não têm achado que valha a pena sentar quatro anos nos bancos universitários para conseguir a habilitação. Se os dados da reportagem não permitem falar com absoluta certeza em desinteresse pelo magistério, pode-se dizer, por certo, que os estudantes questionam a relação investimento-retorno relacionada à formação para a profissão.
Mas, voltando ao provável desinteresse (acredito nisso, independente desses números), a reportagem traz a opinião de uma série de especialistas sobre quais seriam suas causas. Essas opiniões convergem para uma unanimidade: a baixa remuneração. Todos concordam que o professor ganha mal, tanto na escola pública quanto na particular. Eu, particularmente, acho que essa constatação óbvia tem sido evitada ou minimizada pelas administrações públicas do país, e que há até um esforço ideológico para desacreditá-la (mais de um especialista em educação jura de pé junto que professor ganha bem e maior investimento não significa mais qualidade). Assim sendo, é bom ver que essa idéia começa a incomodar a sociedade com sua evidência gritante, e que isso pode gerar uma movimentação social de apoio a muitas de nossas reivindicações.
Mas, se é para falar de causas (como os baixos salários) em relação a efeitos (a menor procura pela carreira), acho que é de se estranhar que nenhum dos especialistas tenha citado as dificuldades cotidianas dos docentes em salas de aula: violência, desinteresse, carga excessiva de trabalho, assédio moral, ruído excessivo, falta de recursos adequados etc. Esse estranhamento, para mim, é o que motiva a última pergunta da reportagem local ao vice-presidente do Conselho Estadual de Educação, João Cardoso Palma Filho: "A conduta das escolas em relação aos professores contribui para o desprestígio da profissão?". Simplesmente não entendi a resposta "acho que o problema é basicamente o salário". Definitivamente, o entrevistado abriu mão da possibilidade de citar outros fatores que, para mim, são muito mais decisivos que o salário para a escolha dos jovens. Na verdade, talvez falte coragem para dizer o que as olheiras, o cansaço, o stress, o mal-estar geral estampado no rosto dos profissionais de magistério expressam com tanta veemência: está difícil lecionar. Está difícil voltar para casa com a certeza de ter conseguido contruir algo de positivo. Em muitos casos, e sei que não posso nem generalizar nem particularizar ao dizer isso, as condições têm sido degradantes para os profissionais. Vi muitos colegas ingressantes na carreira, tanto pelo Estado quanto pela Prefeitura, simplesmente pedirem exoneração, em que pese a segurança e estabilidade de ser concursado. Vejo todos os dias coisas absurdas acontecerem, e ouço todos os dias profissionais que reclamam de coisas absurdas. Não, caro leitor que não conhece a área da Educação, não somos uns chorões! Pelo contrário, a maioria dos profissionais que conheço tem como característica se superar dia após dia diante dos problemas que se interpõem à sua prática.
Não tenho dúvidas de que esses fatores devem ser considerados para que se dimensione adequadamente o desinteresse dos jovens pela carreira do magistério. E também não tenho dúvidas de que, se não estabelecermos como um dos objetivos principais da educação a criação de condições adequadas para um exercício sadio e digno da profissão, não conseguiremos salvar a carreira do desinteresse e da desvalorização social que a atingiram.

sábado, 8 de novembro de 2008

Tocante

Encontrei um aluninho voltando para a favela com sua caixa de engraxar nas costas e uma outra de sapatos, encapada, com uma pequena fresta para colocar moedas, nas mãos. Brinquei:
- Pra que essa caixa aí?
Disse-me que era para pedir gorjetas de Natal. Para provocá-lo, argüi que o Natal era só em dezembro.
- Para a gente rica, é só dezembro mesmo. Para a gente pobre, começa bem antes.

Pois é.

Paro por aqui.

Impressões do Congresso - parte 2

O Congresso do Sinpeem terminou de forma meio chocha. Não houve plenária no último dia, e não se discutiu nem um décimo do que estava previsto na pauta. Nas votações, a diretoria obteve algumas vitórias, amargou algumas derrotas, e diminuiu consideravelmente o espaço das discussões com os congressistas.
Entretanto, nesseúltimo dia, tivemos a oportunidade de apreciar aquela que foi, de longe, a melhor das falas entre todos os palestrantes convidados. Ouvimos Gabriel Perissé, falando de leitura, e entregando o produto prometido: em vez de criar uma exposição desinteressante sobre como dar aulas interessantes, bateu numa única tecla, a necessidade de ler constantemente, e usou de ironia, provocação, bom humor, magnetizando a audiência. Piadas como "livro não se empresta e não se devolve" faziam a platéia rir e ao mesmo tempo refletir. Gabriel insistiu num ponto que se associa à idéia central do meu último post. Para ele, é preciso valorizar a palavra, saber usá-la, saber fazê-la incomodar com as pessoas. Isso ele propôs, isso ele fez.
Com uma capacidade tão grande de dialogar com as reações do público, ele acabou quase nem precisando da tecnologia digital. Usou o powerpoint apenas duas vezes, para mostrar curtas histórias de livros infantis ilustrativas de suas falas. Sua oratória e sua capacidade de interagir garantiram com sobras o sucesso da palestra. Para mim, essa dinâmica é a ideal: o recurso tecnológico tem de ser acessório da mensagem, e não o contrário. Gabriel me brindou com um exemplo prático disso.
Gostaria de ilustrar a questão do diálogo com o público descrevendo uma engenhosa artimanha do palestrante, revertendo uma situação que lhe era desfavorável. Em determinado momento, brincando com a audiência, cuja absoluta maioria era de mulheres, Gabriel falou de um camelô que anunciava remédio para feiúra. Ele disse que descobriu que o remédio era "batom, lápis..." e complementou a enumeração com "essas coisas que vocês usam". Essa frase, que era evidentemente uma brincadeira provocativa, foi recebida com bom humor por metade do auditório, e uma indignação ranzinza pela outra metade, que não gostou de ser chamada de feia. Claro, a intenção era apenas divertir pela sacanagem, coisa muito comum entre pessoas mais íntimas. Mas Perissé percebeu que o tiro aparentemente saíra pela culatra. O que fez? Continuou dizendo mais ou menos o seguinte: "quando acordo e olho no espelho, vejo o caos, mas como sou homem, apenas ajeito um pouco e vou trabalhar". O auditório voltou a rir, mas ainda estava com pé atrás. Ele continuou: "minha mulher e as mulheres em geral, não; quando elas vêem o caos, não saem de casa até transformá-lo em cosmos, e para isso usam os cosméticos". A brincadeira foi bem recebida, mas a virada veio depois: "e eu admiro e acho que é por isso que a educação tem tantas mulheres: pelo dom que elas têm de transformar o caos em cosmos". Pronto. O auditório veio abaixo. Aplaudiu calorosamente. O palestrante deu a volta por cima e retomou a empatia do público, graças a sua inteligência comunicacional.
Eu estava no auditório acompanhando tudo isso e pensei: como o cara é bom. Porque o que ele disse é que, se as mulheres conseguem transformar a feiúra (caos) em beleza (cosmos) em relação a sua aparência, podem fazer isso com a educação. Ou seja: ele incorporou de novo no discurso a feiúra das mulheres e a questão dos cosméticos de uma forma que elas aceitaram, em virtude de uma comparação elogiosa. E no percurso dessa incorporação, ganhou a confiança para a sacada final a partir da inclusão de sua própria aparência na mesma lógica, o que contribuiu para amenizar a sensação de ofensa provocada pela brincadeira. Muito esperto, muito inteligente.
Isso é para poucos. Isso a tecnologia, sozinha, ainda não pode conseguir.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Impressões do Congresso

Passo esta semana inteira no Congresso do SINPEEM, que se realiza no Anhembi. Hoje foi o primeiro dia, com direito a fila de duas horas para almoçar.
Devo dizer, em primeiro lugar, que sendo este um blog dedicado aos professores e a seu valor, exporei minhas impressões de maneira inversa à que me veio à cabeça. Quando vi a fila para o almoço começar a ser formada uma hora e meia antes do fim do evento do qual participávamos, e o auditório quase completamente vazio antes do fim da fala dos convidados, pensei algo. Algo que engoli, degluti e transformei em: parabéns àqueles que, como eu, permaneceram no auditório até o fim do painel, gostando ou não gostando do que se dizia, por respeito a quem palestrava e à condição de delegados eleitos para posteriormente multiplicar as informações conseguidas no evento. Parabéns a esses.
Devo dizer, agora, que me incomoda uma certa (neologismo absurdo, eu sei) powerpointização da educação. As apresentações em computador são bonitinhas. Mas os slides são interessantes se trazem imagens para enriquecer as falas, dados relevantes para o raciocínio ou frases que importa detalhar. Para todo o resto, fica excessivo: frases de efeito, gráficos e esquemas para simplificar o que está sendo dito, florezinhas e bichinhos, vídeos que só com muita boa vontade podemos associar à exposição. É importante ressaltar que a palestra NÃO É o PowerPoint. O recurso não pode substituir o conteúdo. E nada, nada mesmo, substitui uma argüição convincente, bem construída, e um diálogo bem conduzido de dúvidas e contestações.
Acho desnecessário tentar esquematizar todos os raciocínios, ou estabelecer gráficos e ilustrações para toda idéia exposta. Acho bobagem transformar os momentos (raros ultimamente) de contato espontâneo entre pessoas em uma festa de distrações coloridas e facilitações mentais. Acho cruel às vezes recebermos apostilas que são tão-somente apresentações em PowerPoint impressas em preto e branco, como se ali estivesse um passo-a-passo esperando apenas ser assimilado, consumido e colocado em prática.
Meus alunos na faculdade também têm essa mania. Isso precisa mudar. Julgo que seja um modismo calcado muito mais na insegurança em relação à exposição oral que na convicção da qualidade e capacidade de persuasão do material visual.

sábado, 25 de outubro de 2008

Marcaram uma excursão para as 6ªs séries. A criançada ia ao Cinemark ver algum filme da moda que não lembro. Comida inclusa, condução, tudo certo. Sairia 5 reais para cada uma.
Pediram dois ônibus, considerando o número de alunos das 4 séries. Receberam, na véspera, confirmação da Coordenadoria de Ensino sobre isso: viriam dois ônibus.
Veio um só.
Acomodaram, então, as carinhas ansiosas e sorridentes de duas das turmas nesse ônibus. Restaram 27 alunos para 11 lugares.
Proposta número um: acomodar os alunos em trios nos bancos. Recusada, por questões óbvias de segurança da condução.
E a criançada, trocada e preparada para a festa, com aquela carinha de "ué?". E o tempo passa, e o filme tem horário.
Proposta número dois: colocar onze alunos nos lugares vagos, e dividir os outros 16 pelos carros dos professores, que acompanhariam o ônibus. Recusada, por questões legais e possíveis complicações. Os alunos não assinaram termos de responsabilidade para andar em veículos de professores. Se acontece alguma coisa, vira problema, e tal.
E a face da criançada já segura um pouco mais a alegria do passeio, agora já vislumbrando a possível frustração. E o tempo passa, e o filme tem horário.
Proposta número três: retornar o ônibus à escola para realizar uma segunda viagem, levando o que sobrasse de aluno. O motorista topou, os professores concordaram, a escola apoiou. Ligaram para a Coordenadoria. A Coordenadoria gostou da idéia, e ligaram para a empresa. A empresa vetou. Duas viagens implicariam uma diferença em gasolina, horários e pagamento do motorista que eles não estavam dispostos a acertar. Mesmo tendo a Coordenadoria oferecido pagamento das duas viagens.
E a criançada ali, com a frustração já nitidamente estampada no rosto.
Proposta quatro: mandar os alunos para casa, e resolver a questão depois, de outro modo. Imediatamente aceita, visto que a única que não implicava nenhum trabalho adicional de ninguém.
E lá vão os meninos de volta para o lar, sem poder usufruir de um passeio já pago, para o qual se prepararam a semana inteira. E ainda sabendo que os coleguinhas das outras turmas tiveram melhor sorte.

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _


Os professores estão revoltados, e com razão, com o absurdo da situação, enquanto eu, mesmo sensível à frustração dos alunos, tenho vontade de rir de tudo aquilo.
Quem teria sido o responsável por isso? Recuperam-se e-mails da coordenação, da escola, da Coordenadoria. Verifica-se que o erro tinha sido da Coordenadoria.
Qual seria a lógica da coisa então? A Coordenadoria ASSUMIRIA seu erro, e ofereceria a esses alunos nova ida ao cinema, com tudo pago e, até pelo incômodo causado, algum desagravo compensatório. Isso seria o mínimo, porque, para o entendimento de pais e estudantes, professores e escola, sendo os agentes visíveis do passeio, acabariam como culpados do que ocorreu.
Mas não. O papo que corria até ontem era que a coordenadora e a diretora pagariam de seu próprio bolso esse novo passeio. Protestei com a coordenadora. Não é certo, e cada um tem de assumir suas responsabilidades. Uma palhaçada dessas e ainda as pessoas da escola serem oneradas? Para quê? Para não ter de "criar um clima ruim na Coordenadoria"? Poupar pessoas, nesse caso, implica em prejudicar outras.
Vou esperar o desfecho para atualizar este post. Mas creio que estamos diante de mais um incrível e maluco caso de MISH, medo infundado dos superiores hierárquicos, uma praga que assola a educação e nos transforma em cordeirinhos de administrações incompetentes.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Entre socos e pontapés

Um aluno nosso desferiu um soco na professora de Matemática após uma discussão . Foi impedido de agredi-la ainda mais porque a inspetora de alunos o segurou. A professora fez o boletim de ocorrência, como manda o figurino.
O aluno foi convidado a ficar em casa por alguns dias pela direção (alguma legislação que não sei especificar proíbe a escola de suspendê-lo; a suspensão é camuflada em subterfúgios de discurso como esse). Voltou depois de algum tempo, com a mãe, e, pelo que entendi, a idéia era a de que freqüentaria normalmente as aulas da professora agredida como se nada tivesse acontecido. A professora protestou com a direção, que não conseguiu convencê-la a voltar para a sala de aula com a presença do aluno. Como solução conciliatória, o aluno permaneceu na escola, mas foi deslocado para o período noturno.
Duvido que essas ocorrências sejam isoladas ou eventuais. Acho que a realidade da sala de aula, hoje, é bem parecida com isso. Acho que nossa categoria profissional tem tolerado até demais esse tipo de abuso.

sábado, 9 de agosto de 2008

Algumas primeiras impressões

Eu ando pelas ruas do bairro em que moro (Campo Belo, na cidade de São Paulo). Freqüentemente ouço vozes que me chamam, vejo mãos que me acenam, percebo sorrisos nos rostos dos que me olham. Minha condição de professor me faz referência de várias crianças.
Ser referência não é o mesmo que ser exemplo, ou ser popular. Acho que está relacionado a ser alguém em quem você deposita alguma confiança, ou que você respeita em função de determinado valor. É certo que nós, professores, temos uma condição de poder em relação aos alunos, mas também somos parâmetro imediato e próximo de muitas das avaliações que eles fazem da experiência que carregam. As aulas, muitas vezes, são o único espaço em que eles podem desenvolver, sem a pressão do dia-a-dia, as reflexões acerca de si próprios e de sua condição de estar no mundo. Além disso, parece-me que, para muitos alunos, somos as únicas figuras do serviço público que eles encontram constantemente e com quem têm contato além do profissional (nossa relação com os estudantes é diferente da do médico com os pacientes ou do policial com os cidadãos).
Sinto-me recompensado toda vez que percebo o carinho e o respeito com que sou tratado. Sinto-me reconhecido tanto por meu desempenho profissional quanto pela importância da profissão que exerço. Creio que, se não fosse isso, dificilmente resistiríamos às condições de trabalho que encontramos nas escolas e à necessidade de convivermos diariamente com a violência e a miséria humana em suas diversas configurações.
Tenho comigo que exerço a profissão mais importante da sociedade, e a mais política (no sentido verdadeiro da palavra), sem sombra de dúvida. E penso também que a sociedade brasileira ainda não percebeu a importância dos professores para a construção da cidadania. Quando as crianças nos cumprimentam e nos prestigiam, penso que no futuro, talvez, elas venham a constituir uma sociedade mais atenta a essa questão.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Intenções

Quero usar este espaço para postar textos e notícias sobre a profissão de professor, e contibuir para uma visão mais justa a respeito desse profissional.