sábado, 23 de janeiro de 2010

Da leitura de "A escola frente à complexidade", de Perrenoud

Da bibliografia do Concurso da Prefeitura para Ensino Infantil e Fundamental, separei para ler a obra Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza, de Philippe Perrenoud. Eu não havia lido com a atenção necessária esse livro até então, e posso dizer que seu primeiro capítulo foi uma surpresa positiva. Ele se chama "A escola frente à complexidade", e traz uma série de indagações necessárias para bem mapear os fenômenos da educação atual.
O que considero mais bacana nessa parte do livro é a compreensão de que não há como resolver definitivamente certas questões, restando-nos apenas refazê-las com parâmetros mais abrangentes e reconhecendo as forças sociais e éticas nelas implicadas. Ou seja: não tem receitinha de bolo. Sendo assim, quaisquer modelos de gestão que estejam baseados no prescritivo e no hierarquicamente correto estão fadados à ineficiência.
Parece-me que uma das consequências mais básicas que se deve tirar das reflexões de Perrenoud é que o professor e os gestores formam uma equipe, e que enfrentam, do ponto de vista do funcionamento da escola, os mesmos problemas. Para mim, isso implica uma necessidade vital: a de que o conhecimento e a informação circulem entre todos os membros dessa equipe. Portanto, professores não podem ser meros aplicadores de aulas (ainda que isso seja cômodo, como o autor descreve quando cita a "sono burocrático"). Por consequência (e porque as aulas são opções intelectuais, ideológicas e políticas), professores devem atuar de forma criativa e participativa, devem ter autonomia, devem se caracterizar por um trabalho efetivo de pesquisa, estudo, reflexão. E isso só é possível quando se pensa que o professor é um intelectual atuante, não um cumpridor de ordens, e que os gestores são articuladores desse capital humano, e não feitores que garantem prêmio e castigo para cada etapa a ser cumprida do cronograma.
Claro que essa leitura é toda minha, e isto nem de longe é um resumo do texto. Faz muito bem para mim poder pensar a respeito desses assuntos, e nem sei se estou habilitado a acertar alguma questão sobre o tema no concurso; isso é totalmente secundário. Tenho certeza de que os autores da bibliografia que estou lendo não gostariam de ser decorados e aplicados, e sim discutidos e questionados. Só vale a pena lê-los por causa disso.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Por que destruíram o CEU Três Pontes, no Jardim Romano?

Hoje, li uma notícia muito triste. Indivíduos não identificados detonaram materiais e instalações do CEU Três Pontes no Jardim Romano.
Não consigo nem chegar perto das razões para atitudes desse tipo. Lamentavelmente, elas não são tão raras. Ano passado, alunos fizeram uma destruição absurda e criminosa da escola estadual Amadeu Amaral, na Mooca, num ato de histeria coletiva muito difícil de compreender, quanto mais de aceitar.
Um concurso público que prestei recentemente teve como tema a violência na escola, e propôs uma redação a partir de três textos que discutiam esse tipo de ação. Embora minha nota na redação tenha sido razoável, não faço a mínima ideia de como se possa resolver esse problema. E olha que convivo com ele constantemente, ainda que em menor escala.
Sinceramente, acho que as causas da violência são muitas, e muito diferentes. E penso, ainda, que o peso dessas causas varia em cada situação específica. Por isso, não é possível indicar uma ação ou um conjunto de ações que, sozinhos, possam dar conta de prevenir e evitar esse tipo de comportamento de forma definitiva. Por questões de formação humanística, acredito que a falta de perspectiva dos jovens e os problemas socioenômicos e conjunturais da comunidade estão na raiz de muitos desses absurdos; sei, no entanto, que não os explicam inteiramente. Há um componente de maldade e mau-caratismo que não pode ser desconsiderado, e contra o qual só é possível lidar com uma ação policial precisa e punição exemplar.
O descaso das autoridades aumenta a incidência de problemas sociais, o que, sem dúvida alguma, colabora para alastrar a violência. Entretanto, examine-se o caso do CEU Três Pontes. Sim, o bairro está alagado. Sim, os moradores se manifestaram agressivamente quando o prefeito Kassab esteve por lá. Sim, há uma série de problemas de conjuntura. Mas isso nem de longe justifica o que aconteceu. Os depredadores entraram, quebraram um monte de coisas, destruíram materiais, botaram fogo em cadeiras, picharam o teto, fizeram de tudo o que podiam (ou não podiam). É difícil crer que tudo isso seja meramente falta de perspectiva, falta de cidadania ou revolta pelo descaso das autoridades. É difícil aceitar que alguma sensação adolescente de poder ou impunidade, por si só, leve alguém a quebrar brinquedos de crianças e equipamentos de uma das poucas instituições que as atendem em uma região carente. Para mim, é muito claro que existe algo nesse episódio que ecoa nos aspectos mais sombrios da personalidade humana. Não foi um roubo, não foi um protesto, não foi uma brincadeira, não foi uma bebedeira, ainda que possa ter sido de tudo isso um pouco. Houve evidente prazer na destruição.
Mas não sei se podemos fazer alguma coisa para evitar a manifestação desse aspecto obscuro da mente humana, a não ser responsabilizar e punir quem o exterioriza. Já pensando como governante, e não como policial ou psicólogo, o que caberia fazer seria propor soluções para os problemas estruturais da comunidade, ouvindo-a e contando com sua participação ativa nas ações implementadas. Não sei se isso evitaria outros atos de vandalismo como o que foi visto, mas ainda acredito que a cidadania política é o melhor antídoto contra a disseminação da violência. A perversidade e a imbecilidade infelizmente não desaparecerão, mas sempre é bom que encontrem menos oportunidades para mostrar os dentes.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Lousa

Eu tinha um professor na Filosofia que nunca escreveu no quadro-negro. Não era questão de gostar ou não do recurso, o problema era a alergia a giz. Era chegar perto do pozinho branco e começar a espirrar sem parar, perdendo totalmente o fio da meada.
Há dois anos atrás, fizeram uma reforma na escola da Prefeitura em que leciono, e trocaram todas as lousas. Colocaram umas do tipo quadro-negro, bonitinhas, quadriculadas, adequadas a demonstrações matemáticas, e tal. Mas, sinceramente, não consigo entender porque não colocaram logo as lousas brancas - que, inclusive, também podiam ser quadriculadas e bonitinhas. Não sei qual é a preferência dos colegas professores, mas a minha é definitiva pelas últimas, por uma série de razões:
1) o pó de giz é algo que corrói os dedos aos poucos, e quem toca violão, como eu, sabe que ele compromete o desempenho;
2) o pó de giz é terrível para quem tem rinite;
3) o pó de giz entra nas vias respiratórias e isso prejudica a voz;
4) lousas negras racham com facilidade, e, por vezes, tornam-se inutilizáveis;
5) as canetas são melhores para manusear que os gizes;
6) as canetas com seu apagador são mais leves que os gizes com seu apagador;
7) lousa branca é melhor para o aluno enxergar;
8) lousa branca é melhor para projetar coisas;
9) lousa branca é melhor de limpar, se as pessoas usam a caneta certa;
10) os alunos não têm como atirar sobras de canetas um no outro durante a aula, o que acontece com frequência em relação às sobras de gizes.

Trabalho na FIP com lousa branca e no Chiquinha (Prefeitura) com quadro-negro, e não tenho dúvidas do que é melhor para a aula e para minha saúde. Só não sei quais são os custos em cada um dos casos. Mas creio que, se botar no papel, mesmo que o quadro-negro seja mais barato, a relação custo-benefício - incluindo a questão da saúde - sempre penderá para as lousas brancas. Mas deve haver quem prefira o quadro-negro, senão não teriam feito um contrato - provalmente caro - para reformá-los na escola inteira. A ficha que ainda não caiu é: quais são as vantagens que fazem com que o quadro para giz seja mantido nas escolas? Alguém me explica?