Acho muito complicado o governo do Estado, de um ano para o outro, decidir que os profissionais que vêm atuando em caráter precário e temporário nas escolas precisam comprovar, numa prova de 80 questões, se têm ou não habilitação para continuarem trabalhando dentro da mesma precariedade de contrato e fazendo basicamente aquilo que já faziam. É realmente estranho pensar que esses indivíduos, que ganham uma miséria por quebrar o galho da rede quando faltam professores nas escolas, podem passar a ser considerados, do dia para a noite, incapazes de fazer o que fizeram por anos, com anuência e até incentivo do poder público. As pessoas não estão prestando provas, nos últimos dias, para ingressar num sistema de educação pública, fazendo parte de sua estrutura e participando de suas decisões. As pessoas estão prestando provas para mostrarem que podem, se for o caso e se convier à Secretaria de Educação, ser contratadas por esse sistema por um determinado período de tempo. Se elas decorarem as propostas de ensino e o resto da bibliografia e acertarem as 80 questões (vejam bem, 80 questões em 4 horas), estarão atestando apenas que podem receber essa chance do Estado, mas ainda não farão jus a aparecer no seleto rol dos concursados, com estabilidade, possibilidades de escolha mais amplas e garantias de, pelo menos, continuidade do trabalho. É isso mesmo: o sujeito pode acertar todas as 80 questões e continuar sem saber sobre o que acontecerá com ele no anos posteriores. Não consigo acreditar que haja alguma boa vontade nesse processo. Para mim, é pura exclusão, pura necessidade de eliminar, de rotular, de classificar. Pura economia da educação, tentativa de evitar ao máximo a caracterização de vínculo do profissional. Até porque saber as propostas e o resto da bibliografia de cor não garante qualidade de ensino, nem sequer atesta capacidade de aplicá-las com competência. E eu até diria que aplicar as propostas com competência também não garante qualidade de ensino, porque as propostas não são O ensino, mas apenas UMA PARTE dele.
Por tudo isso, penso que o Estado deveria mobilizar-se para abertura de concursos, para preencher as lacunas da rede com profissionais que tivessem, no mínimo, a garantia da continuidade de seu trabalho. Garantida a continuidade, deveria-se trabalhar a tão propalada e tão mal conduzida formação contínua. Aí, sim, o Estado poderia contar com um corpo de trabalho sólido e apto a estabelecer e gerenciar bons processos e projetos a longo prazo. Mas, do jeito que foi feita, essa prova de OFA é uma crueldade: seleciona mal, e não garante nem o básico do básico para quem é selecionado.
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A expressão "resto da bibliografia" foi adicionada posteriormente, a partir de um comentário da Patrícia, para deixar claro que entendi que a prova do Estado exigia mais que a proposta curricular. O que apenas reforça minha tese sobre a crueldade do exame.
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