Estávamos voltando das férias, primeiro dia de aula. Na verdade, primeiro dia de escola, porque nunca tem aluno no primeiro dia. Vimos as cadeiras, muitas, no pátio, como senha para sentarmos. Ficamos aguardando a chegada da coordenadora, mestre de cerimônias das boas-vindas e da reunião pedagógica que precede todo início de trabalho semestral.
Dali a pouco, o DJ (ou o funcionário da escola deslocado para essa função) coloca para tocar umas marchinhas simpáticas de Carnaval. Entram a diretora, as coordenadoras, as assistentes de direção. Dançando. Usando máscaras de baile. Simulando uma alegria de bloco em desfile. E nós sentados, em choque.
Nossas superioras hierárquicas continuam dançando, bailando, ao som da música. Puxam alguns professores para dançar. Nós, sentados, em choque, e mesmo os professores que aceitam o convite, só o aceitam porque também estão em choque.
O burlesco espetáculo segue por uns três minutos, até que um sinal da diretora ordena que a música seja abruptamente cortada. As superioras tiram as máscaras, fecham as caras e colocam-se em posição de sentido e dominância, bem à frente do grupo pasmado. Segue-se, a partir daí, a explicação/justificação da dinâmica.
A diretora diz que estamos num período de Carnaval, de alegria, de festa. E pergunta aos professores: será que tudo é festa? Será que podemos levar o trabalho pedagógico com essa postura? Até quando o Brasil vai ser um país de Carnaval, de festa? Quando vamos levar nossas responsabilidades com seriedade? E por aí foi.
Para além do fato de a dinâmica ter sido um espetáculo de mau gosto e uma lição de como não se deve fazer uma recepção de professores, ficou óbvio que ela foi ineficiente. Se se queria falar da seriedade escolar em oposição a um clima de festa, e o mote era pegar as pessoas no "pulo do gato", ou seja, assombrá-las e interpelá-las pelo flagrante de alegria que eventualmente estivessem extrapolando, nada mais inútil do que criar uma cena de tamanha bizarrice. Quem dentre nós, conhecendo o caráter da direção e dos coordenadores, já não desconfiaria de que a celebração era uma armação, e já não colocaria o pé atrás na sua eventual intenção de festejar? Por outro lado, quem é que, em sã consciência e no pleno uso de suas faculdades de sensibilidade, não é capaz de reconhecer uma alegria falsa, forçada, forjada? Quem não estranharia tamanha efusividade naquele ambiente, naquela situação, naquele dia específico?
O pior não é isso. O pior é que a própria essência da dinâmica é absolutamente questionável. Era como dizer: "vocês, professores, devem levar o trabalho a sério", o que pressuporia não sermos sérios. Ou ainda: "não é admissível alegria e festa nesta escola", o que equivale dizer que só se pode considerar como trabalhador o indivíduo emburrado, fatigado, triste e reticente nos sorrisos e nas manifestações de afeto.
Mas para uma coisa a dinâmica serviu. Sempre que eu quero dar muita risada, eu lembro da graça que abafei naquele dia, com o olhar voltado para o chão para não debochar do constrangimento alheio.
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