Pediram-me uns alunos do curso de Pedagogia que eu corrigisse seu TCC. Atolado de atribuições, adiei a leitura e correção do trabalho até uma data confortável, na qual pudesse aplicar-me com a integridade devida à leitura. Calculei que, finalizando meus apontamentos numa antecedência de até dez dias da entrega, daria tempo para que verificassem as alterações necessárias.
Faltavam justamente dez dias para a entrega quando encontrei um dos alunos. Cobrou-me do trabalho. Respondi que já o estava encaminhando, com as devidas observações, e que no dia seguinte estaria pronto. Surpreendi-me com a afirmação de que não seria mais preciso.
- Por quê? Vocês não têm de entregar daqui a dez dias?
- Ah, sim. Mas tem feriado esta semana.
- E vocês não vão mexer no trabalho no feriado?
- Não, né!
E não sei descrever esse último "não, né!". Parafraseando, seria algo como "é óbvio que não, são quatro dias de feriado e vamos viajar e ninguém vai ser tonto de ler nem escrever nada do TCC", dito com um sorriso que mofava de minha "inocência", mas sincero, e algo cínico, se é que isso é possível.
Findo o diálogo, passou um filme na minha cabeça. Meus dias de estudante. Minhas leituras feitas nos fins de semana. Quantas reuniões de grupo. Trabalhos exaustivamente corrigidos até quase minutos antes da entrega. Meus dias de mestrando. As últimas semanas antes do depósito da dissertação. Minha leitura minuciosa e desesperada de cada parágrafo três vezes antes da impressão definitiva. Os dois dias sem dormir antes da defesa. Tudo.
Fiquei me perguntando se eu levo as coisas a sério demais, ou se aqueles alunos levavam as coisas a sério de menos. Conversei com algumas pessoas, expliquei a cena, expus meu pasmo. A coisa mais sensata que ouvi a respeito foi: a importância que você dá para certas coisas é diferente, seus valores são diferentes, você não pode querer que as outras pessoas tenham os mesmos valores que você.
Isso é sensato como conselho, mas ainda não me conformo. Na era da Internet, do MSN, do celular, das mensagens de texto, e de tudo o mais, cinco pessoas (já acho isso um absurdo, TCC grupal), a dez dias da entrega do trabalho mais importante de seu curso de graduação (trabalho com graves problemas de redação, diga-se de passagem) simplesmente não vão se falar, não vão se reunir, não vão fazer um mínimo esforço adicional para melhorar seu texto. O que haverá de tão mais importante que a entrega desse TCC para esses alunos? Gostaria de saber. Porque se é tão mais importante assim, eu bobeei em minha vida de estudante inteira e provavelmente continuo bobeando em minha vida de professor. Preciso entender essa escala de valores, antes que passe por situação similar e fique com a cara de besta que fiquei.
Um comentário:
Olha Xingu. Acho que o maior problema ai é o TCC grupal. Cara, ninguém tá levando a sério mesmo, nem quem pede o trabalho, nem quem faz.
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